O ex-prefeito de Coelho Neto, Dr. Magno Bacelar era um grande contador de história e costumava escrever cartas sobre seu passado e de sua família. Trouxemos aqui um dos muitos textos que ele escreveu, esse falando sobre a abertura da estrada que vai de Coelho Neto até o Descanso.
Sobre a polêmica da “palha de
arroz”, que rola em Coelho Neto nas redes sociais, ele nada cita, o que nos faz acreditar
que esse negócio de que a estrada teria sido demarcada com palha de arroz jogada de um avião sobrevoando o percurso está mais para conto do imaginário popular do que
para história de fato.
Vamos ler o que disse Dr.
Magno sobre a estrada.
A ESTRADA
A estrada traz o desenvolvimento, abre fronteiras, une os povos, aguça a nossa imaginação, alimenta a saudade e inspira poetas. Na minha infância, em Coelho Neto, as estradas não passavam de caminhos por onde transitavam os animais de carga e montaria, os carros de boi e os três pequenos caminhões existentes na cidade. Quando esporadicamente aparecia um carro de laboratórios ou caixeiro viajante, era uma festa e assunto para comentários nas rodas de conversa na cidade.
Em verdade nada produzíamos para escoar nem, tão pouco, nos constituíamos mercado importador que justificasse investimento em rodovia. As atividades agrícolas e pecuárias mal abasteciam o mercado interno. Os bens de consumo subiam ou desciam o rio procedentes de Parnaíba e Teresina. À medida em que fomos avançando, a nossa carroçável foi recebendo alguns melhoramentos, nada muito significativo, até mesmo a implantação da Usina ITAPIREMA (de açúcar e álcool) ainda enfrentou dificuldades julgadas intransponíveis. Uma vez inaugurada, a existência de investimento de tamanha envergadura projetou o município e serviu de embasamento para pleitear financiamento já que o Estado não estava sensibilizado para fomentar o transporte.
Seria impraticável investir numa região em que a malha viária dependia das condições climáticas e, em Coelho Neto era assim: se chovia atolava-se ou ficava à margem dos riachos esperando as águas baixarem, se não chovia ficava-se atolado nos bancos de areia formados no leito da velha carroçável. Os irmãos Bacelar tinham muitos outros planos para o desenvolvimento regional dentre eles a AGROPEMA (pecuária de corte) e a CEPALMA (fábrica de papel e celulose). Recém-formado e eleito prefeito o Dr. Afonso Bacelar, nominado “a força da natureza” pelo ideal e vigor da juventude, elaborou projeto para, junto ao BNDES, conseguir financiamento que possibilitasse a reconstrução da estrada.
O projeto técnico foi aprovado e o financiamento concedido, em parte, as obras precisavam ser iniciadas imediatamente. O velho curso ligava Coelho Neto direto a Caxias fazendo curvas e desvios objetivando unicamente a ligação entre povoados, fator que aumentava a distância em muitos quilômetros. Surgiu e continuou, por séculos, sem o menor planejamento ou conservação, jamais foi raspada. A primeira decisão foi mudar o traçado para eliminar os baixios e as obras d’arte que encareceriam, em demasia, os custos do empreendimento. Assim é que a nova estrada, ao chegar ao Bananal, mudou o rumo e subiu para o divisor de águas das bacias do Itapecuru e Parnaíba. No planalto foram possíveis longas retas, evitou-se grandes aterros e pontes. Uma rodovia de segurança, com greide colado, e ao menor custo.
Embora a maior parte do percurso esteja dentro do território caxiense a Prefeitura daquele município e o Estado em nada contribuíram para a grande obra que se iniciava apenas com os parcos recursos do BNDES, as máquinas do Grupo Bacelar, o trabalho e empenho da Prefeitura de Coelho Neto. O desafio que quebrou todos os recordes imagináveis constituiu-se verdadeira epopeia de técnica, improviso e audácia. Topógrafos utilizaram os equipamentos mais sofisticados à época, por se tratar de mais de 60km de mata virgem, foi construída uma pista de pouso na Cajulandia para que o avião dos Bacelar pudesse auxiliar na orientação de retas e rumos além de prestar eventuais socorros. Outra vitória diz respeito ao prazo para conclusão dos trabalhos, previsto inicialmente para seis meses e arrematados em apenas três. Ao final dos trabalhos os desbravadores costumavam dizer que não houve tempo, sequer, para fotografias.
A rodovia que hoje conhecemos e trafegamos ainda é a mesma construída por Afonso com uma única alteração, o asfalto. Através dela, ainda de piçarra, chegaram as vacas nelore puro sangue matrizes e reprodutores do projeto de pecuária e as grandes máquinas da fábrica de papel. Agora havia produção para exportar, Coelho Neto passou a integrar o mapa do desenvolvimento nacional, transformou-se no maior polo industrial do Estado e do Nordeste. Tudo isso teve que ser feito pela iniciativa privada para que o poder público acordasse. Com os holofotes da imprensa e da opinião pública brasileira voltados para nossa terra, o Governo do Maranhão não teve mais dúvidas, veio para a festa: recebeu graciosamente o investimento feito batizou-a de MA, e mandou asfaltá-la. O material utilizado ainda é de péssima qualidade, mesmo assim, é o que existe. Sem luta não há conquistas, continuo disposto a somar com todos aqueles que exercitam a cidadania em busca de uma cidade cada vez melhor para se viver.
Pela estrada
que passa na porta do ITAPIREMA transitaram sonhos infantis, amores da
juventude, vitórias e pequenas derrotas. Nunca o ódio. Hoje sinto que há nela
um engarrafamento de amor e saudades.
Magno Bacelar 23/11/2015